...meu trabalho visual permeia não só a memória, mas a ficção como possibilidade de expansão da memória e de outras memórias inventas em relação as minhas e de outras pessoas.
Assim define sua própria produção Juliana Crispe, que está com a exposição Eu Sou um outro você aqui no Sítio. Saiba mais sobre a sua trajetória, sobre o seu trabalho e sobre como vê o panorama das artes visuais catarinense.
Quando começou a trabalhar sobre a memória?
Logo que entrei no curso de bacharel, ainda Artes Plásticas, no CEART/UDESC, percebi que o que costurava minhas produções (mesmo as inicias e em processo) era a memória. A primeira exposição coletiva na qual participei em 2003 já havia esse fio condutor no trabalho que realizei. Ao longo do tempo, minha produção foi amadurecendo e ganhando novas camadas. Hoje penso que meu trabalho visual permeia não só a memória, mas a ficção como possibilidade de expansão da memória e de outras memórias inventas em relação as minhas e de outras pessoas.
O que a levou a desenvolver o protejo "Eu Sou um outro você”?
Fui colecionando ao longo dos anos imagens fotográficas antigas de minha família, objetos familiares... sempre gostei de tudo que mantinha em mim a relação com o meu passado, com a minha história, mesmo que desconhecido.Um dos vídeos foi desenvolvido no ano de 2005 a partir de um recorte dessas fotografias. Construí um vídeo em que utilizei a estética parecida com ultrassom, entre as imagens turvas, vez ou outra, aparecia fotografias da minha avó Lia entre os familiares, imagens de sua infância até a última imagem que tínhamos dela. Minha avó faleceu em 1996.
Quem conhece um pouco da minha produção sabe o quanto ela, minha avó, se tornou por vezes a personagem de meus trabalhos.
Quando engravidei, em 2014, guardei todas as ultrassonografias de minha filha que também se chama Lia. Aquelas imagens me instigavam... e logo fiz relação com o vídeo construído anos atrás.Neste ano então decidi executar um encontro essas duas mulheres tão importantes em minha vida, pela projeção de vídeos que se encontram em um plano. Em um tempo que se perfura e resiste em mim, não como um passado imóvel, mas um tempo que se refaz constantemente, que se resignifica a cada instante.
Qual a relação deste trabalho com a sua pesquisa em curadoria?
Algumas curadorias que já realizei o eixo conceitual dos trabalhos perpassaram pela memória. Por ser um tema que sempre investiguei, poder curar exposições em que me façam pensam sobre minhas pesquisas sempre desdobram novos olhares. Mas, percebo que, para olhar o trabalho do outro, tenho que deixar o meu quieto, sem contaminar os olhares... cada qual em seu tempo...
Sabemos que é uma grande agitadora cultural. Como vê o panorama das artes visuais na região?
Sempre trabalhei em grupo e alimentada pelo desejo por construir pensamentos coletivos. Acredito muito nisso.
Temos grandes artistas em nossa história e muitos atuantes em Santa Catarina.
O cenário contemporâneo é fortíssimo. O que percebo que esse panorama tem que ser também expandido... Temos que nos comunicar mais, entre o estado mesmo. Aqui na Capital acho que temos boas articulações uns com os outros... Mas precisamos sair dessa zona de conforto e criar diálogos com outros espaços, artistas do estado, cidades...
Como vê as movimentações e propostas dos diferentes espaços culturais na nossa cidade?
Nos últimos anos os espaços alternativos na cidade vieram trazer novas potências na arte, novas visibilidades. Cada qual com sua particularidade, estamos em várias vertentes.
As instituições (governamentais) que temos são muito importantes, vale salientar que a existência delas é necessária e por ela também devemos lutar. Mas articular novos espaços também é necessário.
Fico pensando o quanto conseguimos fazer sem apoios financeiros, o quanto conseguimos movimentar... Mas também precisamos de recursos para que tudo possa ter continuidade.
Sabemos que os espaços culturais independentes da cidade poderiam estar mais conectados tem alguma sugestão para que se possam criar mais pontes nesse sentido?
Sim, precisamos nos articular como grupo também, dialogar. Já está um movimento para isso, só precisamos ser mais ativos e formularmos mais ações para que de fato essa rede se amplie e possamos também traçar projetos em coletividade.